O Ministério Público de Contas de Roraima (MPC-RR) pediu ao Ministério Público Federal (MPF) a imediata paralisação das obras da ‘Selvinha Amazônica’ no Parque do Rio Branco, em Boa Vista, após detectar indícios de fraude em licitação na contratação de uma empresa para confecção dos elementos artísticos.
O órgão ofereceu uma representação criminal junto ao MPF, e outra com pedido de medida cautelar no Tribunal de Contas do Estado (TCE), contra a Prefeitura de Boa Vista, a secretária municipal de obras, Alessandra Pimenta Pereira, além da empresa R. M. AMOÊDO – ME, e o empresário Rossy Marinho Amoêdo.
Além da paralisação das obras e serviços em andamento; o MPC também recomendou a suspensão do contrato e de pagamentos celebrados entre o município e a empresa R. M. AMOÊDO – ME; além do bloqueio de bens da empresa no valor total do contrato, de R$ 7 milhões, recursos oriundos de convênio federal e do próprio município. O caso também será oficiado ao Tribunal de Contas da União para, se assim entender, instaurar a Tomada de Contas Especial, em virtude das eventuais irregularidades.
A ação, de autoria do procurador Paulo Sérgio Oliveira de Sousa, titular da 1ª Procuradoria de Contas, tem como fundamento notícia publicada pelo Portal Política Macuxi, em julho deste ano, acerca do gasto de R$ 7 milhões para contratação de empresa para realização de serviço de engenharia especializado, cuja finalidade consiste na confecção de elementos artísticos, a ‘Selvinha Amazônica’, em área localizada no Parque do Rio Branco.
Com base nas informações públicas, o órgão Ministerial começou a analisar os fatos noticiados e, em análise conjuntural, chegou à conclusão de ocorrência de diversas irregularidades, tais como aplicação irregular do procedimento de contratação e ausência de memorial de cálculo, possibilitando eventual sobrepreço e dano ao erário.
CONTRATO- No dia 23/06/2020 foi dado publicidade do Edital de Pregão Eletrônico nº 095/2020, referente ao Processo Administrativo nº 009194/2020-SMO, que ensejou no Contrato Administrativo nº 915/SMO/AS/2020, firmado entre o Município de Boa Vista e a pessoa jurídica R. M. AMOÊDO – ME.
Consta no Portal de Transparência da Controladoria Geral da União (CGU) que o Projeto ‘Selvinha Amazônica’ é parte integrante do Convênio (SIAFI/SICONV) nº 696691, cujo objeto consiste no “Apoio para requalificação da orla Rio Branco – Bacia Caxangá”, no valor de R$ 59.926.400,00, integralmente liberado ao Município de Boa Vista.
Compulsando as informações disponíveis no Portal de Transparência da Prefeitura Municipal de Boa Vista, mais precisamente das informações atinentes ao Processo Administrativo nº 009194/2020-SMO, que ensejou no Contrato Administrativo nº 915/SMO/AS/2020, firmado entre o Município de Boa Vista e a pessoa jurídica R. M. AMOÊDO – ME, o MPC verificou graves e irreparáveis inconsistências que revelam fraude em processo licitatório por parte dos representados.
Município ‘mesclou’ pregões e impediu concorrência em possível favorecimento à empresa
Conforme os autos do processo, o órgão verificou que o objeto contratado consiste, basicamente, em serviço de engenharia especializada em construção de elementos artísticos, conforme consta no item 2.1 do Termo de Referência nº 008/2020. Ocorre que, segundo a Lei Federal nº 10.520/2002, a modalidade Pregão é destinada à aquisição bens e serviços comuns.
Segundo o procurador Paulo Sérgio Oliveira de Sousa, o objeto do contrato não se coaduna com o conceito de serviços comuns, visto que fora exigido empresa especializada para a realização da obra que, ademais, encontra vedação expressa do uso da modalidade pregão para contratação de obras, com especificações usuais no mercado.
O procurador também apontou que o município de Boa Vista elaborou uma nova “modalidade de licitação”, mesclando procedimento de pregão presencial com pregão eletrônico, revelando indícios de favorecimento à empresa R. M. AMOÊDO – ME.
“Ao que parece, criaram a ideia de pregão eletrônico para, em tese, forjar e direcionar o processo licitatório para contratar a empresa R. M. AMOÊDO – ME e, considerando os documentos e informações constantes no Portal de Transparência, há indícios de direcionamento da licitação, não bastasse o tipo e procedimento adotados de maneira manifestamente irregular para contratação do serviço em comento”, destacou.
Para o procurador, o objeto contratado consiste em obra de engenharia e arquitetura, o que reclama a adoção do procedimento da concorrência. Desta feita, resta evidenciado que a modalidade de pregão não poderia ter sido aplicada ao caso em tela, mas a modalidade de concorrência, prevista na Lei Federal nº 8.666/1993.
Órgão identificou ausência de memorial de cálculo e “prioridade” incomum na pandemia
No caso em espécie, a Procuradoria também verificou ausência do memorial de cálculo, indispensável para a análise dos valores unitários que irão compor o serviço de engenharia e obra na sua integralidade.
“Em virtude do referido memorial de custas, é razoável aduzir que no caso em comento, a referida omissão facilita, e muito, eventual sobrepreço e, por conseguinte, manifesto dano ao erário, o que reclama uma análise detida dos custos unitários e global do Contrato Administrativo nº 915/SMO/AS/2020 pelos órgãos de Controle Externo”, ressaltou o procurador.
Também chamou atenção o fato de que o resultado do suposto Pregão Eletrônico nº 095/2020 fora homologado dia 13/07/2020, enquanto o Contrato Administrativo nº 915/SMO/AS/2020 fora assinado no dia 14/07/2020 e o Extrato do Contrato fora publicado no Diário Oficial do Município (DOM) no dia 15/07/2020, evidenciando uma prioridade “incomum” em tempos de pandemia.
“No entanto, o objeto da licitação não se enquadra nas hipóteses de prioridade licitatória reconhecida pela própria Administração Municipal, conforme consta no Decreto Municipal Nº 38-E DE 22/03/2020”, pontuou.
Outro lado- A reportagem solicitou posicionamento da Prefeitura de Boa Vista sobre as representações feitas pelo MPC, mas até o momento não obteve retorno.