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Mendonça pediu vista em processo contra governador de RR após estado contratar seu instituto

Fonte: O Globo

O ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) André Mendonça, que também compõe o Supremo Tribunal Federal (STF), apresentou dois pedidos de vista e interrompeu o julgamento da ação que pode cassar o governador de Roraima, Antonio Denarium (PP), seis meses após uma empresa de ensino privado fundada por ele fechar um contrato de R$ 273 mil com a gestão roraimense.

Denarium é acusado de poder político e econômico nas eleições de 2022 por ter realizado uma série de ações vedadas em ano eleitoral, como a distribuição de cestas básicas, aumento de gastos com publicidade institucional e reformas nas casas de eleitores durante o período das eleições.

Mendonça solicitou vista do processo pela primeira vez no fim de agosto, e, ao fim do prazo de 30 dias, pediu mais um mês. O novo prazo venceu neste sábado (1) e, pelo regimento do TSE, não são permitidas novas prorrogações. Como além dele ainda há outros cinco ministros para votar, na prática o adiamento pode empurrar a conclusão do julgamento para 2026, último ano de governo de Denarium. Reeleito em 2022, ele não pode pleitear outro mandato.

Ex-ministros de Bolsonaro
A contratação da empresa de Mendonça, o Instituto Iter, foi firmada em 18 de fevereiro entre o secretário de Licitação e Contratação de Roraima, Coronel Everson Cerdeira, e o CEO do Iter, Victor Godoy, que assim como Mendonça foi ministro no governo Jair Bolsonaro. Godoy, que chefiou a pasta da Educação entre março e dezembro de 2022 e é próximo do ministro desde antes de sua indicação para o Supremo, consta como o único sócio do instituto no cadastro da Receita Federal.

O objetivo do contrato, segundo o documento disponibilizado pela própria administração Denarium, é prover capacitação de servidores em Roraima.

No site e no Instagram, onde já soma 12,8 mil seguidores, Mendonça aparece em várias postagens como fundador e “garoto-propaganda” do Iter. Na página, o instituto usa o slogan “conhecimento é o caminho” e destaca como objetivo a “capacitação para transformar profissionais e a sociedade”.

O serviço prestado pela empresa do ministro tinha duração prevista de seis meses. Portanto, quando o pedido de vista foi feito, em agosto, o contrato já tinha sido encerrado e o Iter já tinha recebido os R$ 273 mil.

O movimento de Mendonça ocorreu logo depois de a relatora do processo, ministra Isabel Gallotti, emitir um duro voto pela cassação de Denarium e seu vice, Edilson Damião (Republicanos). Além disso, Gallotti também determinou a realização de novas eleições em Roraima.

A ação de investigação judicial eleitoral (Aije), como é chamada oficialmente na Corte Eleitoral, contra o governador foi apresentada pela coligação de Teresa Surita (MDB), ex-prefeita de Boa Vista (RR) que disputou o governo contra Denarium em 2022.

Empresário do setor agropecuário e imobiliário, Denarium foi eleito como governador de Roraima pela primeira vez em 2018 pelo PSL. Embalado pela onda de direita liderada por Jair Bolsonaro, que venceu a eleição no segundo turno pelo mesmo partido, seu desempenho surpreendeu a política local por desbancar a então governadora Suely Campos (PP) e outros políticos roraimenses influentes do PSDB e do PTB. Em 2022, foi reeleito.

Mendonça chegou ao STF em 2021 por indicação de Bolsonaro, que havia prometido nomear um quadro “terrivelmente evangélico” para a Corte, para a vaga de Marco Aurélio Mello. Antes, ainda no governo Bolsonaro, foi ministro da Justiça e advogado-geral da União.

Procurado por meio da assessoria de imprensa do TSE, o ministro não respondeu aos pedidos de informação.

Inspiração em Gilmar
O Iter – “caminho” ou “jornada” em latim – foi fundado por André Mendonça ao lado de Victor Godoy no início do ano passado como uma instituição de ensino. No site, a empresa afirma oferecer 24 cursos de mais variadas áreas do Direito, desde arbitragem no setor público até um intensivo sobre a nova Lei das Licitações, passando por módulos voltados para prefeitos recém-eleitos – o “Prefeito do Século XXI” – e gestores de guardas municipais.

Entre os destaques estão depoimentos de alunos de diferentes escritórios e órgãos públicos como a Caixa Econômica Federal, prefeituras, secretarias estaduais, Polícias Civis e a Autoridade Portuária de Santos.

Em 2024, ano de sua fundação, o Iter ofereceu um curso de licitações e contratos que contou com aulas magnas de Mendonça e do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Antonio Anastasia.

Em Brasília, o investimento do magistrado do STF e do TSE em uma instituição privada de ensino é comparado ao realizado por seu colega de tribunal, Gilmar Mendes, no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).

O decano fundou a instituição, atualmente comandada por um de seus filhos, antes de chegar ao Supremo ao lado do atual procurador-geral da República, Paulo Gonet. O IDP é a frente institucional do Fórum de Lisboa, o “Gilmarpalooza”.

 

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